PODERES ADMINISTRATIVOS E QUESTÕES COMENTADAS

 

PODERES ADMINISTRATIVOS

 

 

A administração pública exige que o Estado atue para atender os interesses da sociedade. Para isso, ele recebe certos poderes e vantagens. Porém, todo poder traz uma responsabilidade/dever. Portanto, o Estado não só pode, como deve agir quando o interesse público assim exigir. Ele não pode se omitir. 

 

Tal concepção reflete o regime jurídico-administrativo, que se define pela coexistência de prerrogativas estatais e restrições impostas ao poder público, com vistas à consecução do bem comum.

 

Segundo Alexandre Mazza, para o adequado cumprimento de suas atribuições constitucionais, a legislação confere à Administração Pública competências especiais. Sendo prerrogativas relacionadas com obrigações, as competências administrativas constituem verdadeiros poderes-deveres instrumentais para a defesa do interesse público. (Mazza, Alexandre Manual de direito administrativo – 9. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019 Pg. 404).

 

 

ABUSO DE PODER

 

Quando um agente público exerce suas funções da maneira certa, seguindo as regras do Direito Administrativo, sem exagerar nem agir com interesses pessoais, dizemos que ele está fazendo um uso correto do poder.

 

Por outro lado, quando esse poder é usado fora dos limites da lei ou com objetivos que não servem ao interesse da sociedade, ocorre o uso incorreto do poder — situação que também é chamada de abuso de poder.

 

Segundo Rafael Carvalho Rezende Oliveira, "O exercício abusivo dos poderes administrativos deve ser evitado e reprimido, pois revela conduta ilegal. O abuso do poder pode ocorrer em duas hipóteses:

 

a) excesso de poder: a atuação do agente público extrapola a competência delimitada na lei (ex.: policial que utiliza da força desproporcional para impedir manifestação pública); e

 

b) desvio de poder (ou de finalidade): quando a atuação do agente pretende alcançar finalidade diversa do interesse público (ex.: edição de ato administrativo para beneficiar parentes)" 

- (Oliveira, Rafael Carvalho Rezende- Curso de direito administrativo – 8. ed. – Rio de Janeiro: Método, 2020. Pg. 432)

  

PODERES DO ESTADO X PODERES DA ADMINISTRAÇÃO

 

PODERES DO ESTADO - trata-se da tripartição de poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário.

 

PODERES DA ADMINISTRAÇÃO - trata-se de poderes instrumentais conferidos a Administração pública para exercer os deveres estatais ou seja, são as prerrogativas conferidas aos agentes administrativos para que estes possam alcançar o bem coletivo. são poderes da Administração: hierárquico, disciplinar, polícia, regulamentar.

 

Os poderes administrativos são aplicados quando o administrador está exercendo a função administrativa. Desta forma os poderes administrativos são exercidos tanto pelo Executivo quando exerce a função típica de administrar, quanto pelo Legislativo e Judiciário quando estão exercendo sua função atípica de administrar.

 

Características dos poderes administrativos: instrumentalidade, poder-dever de agir, irrenunciabilidade, atuação nos limites da lei e responsabilização do administrador.

 

ATENÇÃO: os poderes administrativos possuem uma margem de liberdade podendo ser vinculada ou discricionária.

 

Muitos autores informam que essa margem de liberdade (vinculada ou discricionária) seria uma característica do poder administrativo,  exemplo: ao aplicar o poder hierárquico o administrador var agir dentro dos limites da lei ao caso concreto podendo aplicar esse poder de forma vinculada ou discricionária. O mesmo ocorre com o Poder de polícia, pois tem momentos que ele será vinculado e em outros momentos discricionário.

 

Portanto essa margem de liberdade trata-se de uma característica dos poderes e não propriamente um poder.

 

É o que leciona Rafael Carvalho Rezende Oliveira:

 

"As espécies de poderes administrativos são: regulamentar (ou normativo), polícia, disciplinar e hierárquico. Entendemos que a discricionariedade e a vinculação, em verdade, não são poderes autônomos, mas atributos de outros poderes ou competências da Administração, razão pela qual serão estudadas no capítulo sobre os atos administrativos."- (Oliveira, Rafael Carvalho Rezende Curso de direito administrativo – 8. ed. – Rio de Janeiro: Método, 2020. Pg 432)

 

Outros autores classificam essa margem de liberdade como um poder propriamente dito.

 

Para não haver confusão estudaremos primeiramente o poder vinculado e o discricionário para após os demais poderes: hierárquico, disciplinar, regulamentar, de polícia.

 

A) PODER VINCULADO 

 

No poder vinculado não há margem de liberdade de escolha do agente. O servidor apenas aplica a lei sem margem de escolha.

 

Segundo Alexandre Mazza: "Onde houver vinculação, o agente público é um simples executor da vontade legal. O ato resultante do exercício dessa competência é denominado de ato vinculado. Exemplo de poder vinculado é o de realização do lançamento tributário (art. 3º do CTN)" (Mazza, Alexandre Manual de direito administrativo – 9. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019 Pg. 413). 

 

Exemplos de poder vinculado: 

 

- Se um cidadão atinge a idade mínima e o tempo de contribuição exigido por lei para se aposentar, o servidor do INSS não pode negar o benefício. Ele deve conceder a aposentadoria, pois todos os requisitos legais foram cumpridos.

 

- Se uma empresa cumpre todos os requisitos legais e apresenta os documentos exigidos pela legislação municipal, o servidor responsável é obrigado a conceder o alvará de funcionamento. O agente não pode recusar ou adiar a concessão por vontade própria.

 

- Se um motorista excede o limite de velocidade registrado por radar, o agente de trânsito deve aplicar a multa, pois a infração está claramente prevista no Código de Trânsito Brasileiro. O agente não pode decidir se aplica ou não a penalidade — está vinculado à lei.

 

- Se um fiscal aduaneiro percebe que um cidadão está passando com muambas ele tem o dever de apreender a mercadoria. Ele não pode ficar pensando se vai ou não apreender.

 

B) PODER DISCRICIONÁRIO 

 

No poder discricionário a lei prevê certa margem de liberdade na atuação do agente, ou seja, a lei dispõe de mais opções dentre as quais o agente pode escolher entre aquela que mais se adequa ao caso

 

ATENÇÃO: o Poder discricionário não confere ampla e irrestrita margem para o agente atuar da forma como bem entender, pois ele continua sujeito a lei e as opções de escolha devem estar previstas na lei além disto, o agente deve obedecer aos princípios do direito administrativo.

 

Exemplo: No estatuto do servidor público federal a lei determina que em caso de suspensão esta ocorrerá em até 90 dias. Quando o administrador for aplicar a sanção ele pode escolher dentro do princípio da proporcionalidade e razoabilidade se vai aplicar de 1 a 90 dias de suspensão e a isso chamamos de juízo de conveniência e oportunidade.

 

Outro exemplo é uma lei local de fiscalização sanitária determinar que em caso de descumprimento de algum requisito, poderá ser aplicada multa de R$ 1.000,00 a 5.000,00. Desta forma,  ao fiscalizar um estabelecimento comercial e verificar que este não está cumprindo alguma regra de vigilância sanitária o fiscal, ao aplicar a multa, terá uma margem de escolha podendo aplicar de R$ 1.000,00  a 5.000,00 e neste momento o agente fará o seu juízo de conveniência e oportunidade.

 

Esse juízo de conveniência e oportunidade tem que atender ao princípio da proporcionalidade e da razoabilidade e também a finalidade do interesse público.

 

Justificativas ao poder administrativo discricionário:

 

1) Impossibilidade de a lei prever todas as situações - A discricionariedade administrativa fundamenta-se, entre outros elementos, na incapacidade da lei de prever todas as situações possíveis e regular minuciosamente a maneira de agir do agente público diante de cada uma delas. Assim, confere-se ao agente a prerrogativa de eleger, entre as condutas viáveis, a que se apresentar mais conveniente e oportuna à luz do interesse público.

 

2) Separação dos poderes - Se todos os atos do governo fossem obrigatórios (vinculados), o Poder Executivo só obedeceria ordens do Poder Legislativo, sem poder tomar decisões próprias. Isso tornaria inviável a sua independência. Por isso, é importante que existam atos discricionários — ou seja, decisões que permitem certa liberdade de escolha — para que o Executivo possa agir com autonomia e decidir o que é melhor em cada situação, dentro dos limites da lei.

 

3) Vontade da própria lei - Em certos casos a própria lei oferece opções a serem escolhidas pelo agente.

 

4) Conceitos jurídicos indeterminados - Às vezes, a lei usa palavras vagas, como "conduta escandalosa", que podem ter significados diferentes dependendo da pessoa ou do lugar. Essas expressões são chamadas de conceitos jurídicos indeterminados. Como não têm um sentido exato, a autoridade precisa avaliar o caso concreto com bom senso, usando critérios de proporcionalidade e razoabilidade para tomar a decisão certa.

  

Controle judicial dos atos discricionários

 

Para que exista uma harmonia entre os Poderes e se evitem excessos na atuação pública, devem existir mecanismos que garantam a fiscalização dos atos (vinculados ou discricionários) praticados pelos agentes públicos.

 

A CF determina no art. 5.º, XXXV, “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

 

Porém o Judiciário não pode intervir de forma ampla nesse controle em virtude da separação dos poderes. Portanto, o Judiciário poderá apenas fazer o controle da legalidade dos atos praticados não podendo avaliar o mérito do ato administrativo.

 

Desta forma,  em relação aos atos discricionários, o Poder Judiciário não pode invadir esse espaço deixado pela própria lei, que autoriza o administrador a agir em razão de oportunidade e conveniência diante dos casos concretos.

 

Logicamente que se o administrador, dentro a atuação de um ato discricionário, violar princípios como a proporcionalidade e razoabilidade poderá o judiciário intervir posto que nesse caso existirá controle da legalidade da atuação administrativa.

 

C) PODER HIERÁRQUICO 

 

O poder hierárquico é interno a estrutura da administração e decorre da distribuição de funções dentro da estrutura da mesma pessoa jurídica ocorrendo tanto nas pessoas pertencentes à Administração Direta (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) quanto naquelas que compõem a Administração Indireta (Autarquias, Fundações Públicas, Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista).

 

É a relação entre chefe e subordinado.

 

Na definição de Rafael Carvalho Rezende Oliveira: "A hierarquia é uma relação de subordinação administrativa entre agentes públicos que pressupõe a distribuição e o escalonamento vertical de funções no interior da organização administrativa." (Oliveira, Rafael Carvalho Rezende Curso de Direito Administrativo – 8. ed. – Rio de Janeiro: Método, 2020. Pg. 458)

 

Portanto, NÃO há hierarquia entre: 

 

- Pessoas jurídicas distintas (ex: entre a União e uma Autarquia não há hierarquia);

 

-  Poderes do Estado (Executivo, Legislativo e Judiciário);

 

-  Administração e administrado.

 

Então quando é aplicado o poder hierárquico?

 

- O poder hierárquico é utilizado pela Administração para dar ordens aos seus subordinados e fiscalizar a atuação destes. 

 

- O poder hierárquico também é aplicado pela Administração para rever seus próprios atos e de seus subordinados quando revoga ou anula algum ato administrativo.

 

- Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro também decorre do poder hierárquico, a competência para editar atos normativos (resoluções, portarias, instruções), com o objetivo de ordenar a atuação dos órgãos subordinados; trata-se de atos normativos de efeitos apenas internos e, por isso mesmo, inconfundíveis com os regulamentos; São apenas e tão somente decorrentes da relação hierárquica, razão pela qual não obrigam pessoas a ela estranhas. (Di Pietro, Maria Sylvia Zanella Di Pietro – Direito Administrativo- 32. Ed.- RJ: Forense- 2019- Pg. 265).

 

-Também decorre do poder hierárquico a atribuição do administrador público de delegar ou avocar competências.

 

DELEGAÇÃO- significa repassar uma atividade de forma temporária a outra pessoa. O conceito esta previsto no artigo 12 da lei 9784/99:

 

Art. 12. "Um órgão administrativo e seu titular poderão, se não houver impedimento legal, delegar parte da sua competência a outros órgãos ou titulares, ainda que estes não lhe sejam hierarquicamente subordinados, quando for conveniente, em razão de circunstâncias de índole técnica, social, econômica, jurídica ou territorial."

 

Veja que na delegação a competência para o ato pode ser repassada a um subordinado ou a outro órgão que não lhe seja hierarquicamente subordinado.

 

O artigo 13 da lei 9784/99 determina as vedações:

 “Art. 13. Não podem ser objeto de delegação:

I – a edição de atos de caráter normativo;

II – a decisão de recursos administrativos;

III – as matérias de competência exclusiva do órgão ou autoridade.”

 

O artigo 14 da lei 9784/99 fala sobre a revogação:

Art. 14, § 2.º "O ato de delegação é revogável a qualquer tempo pela autoridade delegante."

 

A súmula 510 do STF determina que a responsabilidade pelo ato é da autoridade delegada e não da que delegou o ato:

 

Súmula 510, STF: “Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ela cabe o mandado de segurança ou a medida judicial.”

 

AVOCAÇÃO- ocorre quando o superior hierárquico toma para si alguma atribuição de seu subordinado e desde que essa atribuição não seja de competência exclusiva do subordinado. O conceito esta no artigo 15 da lei 9784/99:

Art. 15 – “Será permitida, em caráter excepcional e por motivos relevantes devidamente justificados, a avocação temporária de competência atribuída a órgão hierarquicamente inferior.”

Veja que na avocação a competência ocorre entre o superior hierárquico e seu subordinado e, portanto não ocorre avocação com outros órgãos como na delegação.

 

ATENÇÃO: quando a administração aplica SANÇÕES ela estará utilizando o poder disciplinar como veremos no próximo item e NÃO O PODER HIERÁRQUICO.

 

 D) PODER DISCIPLINAR 

 

O poder disciplinar consiste na prerrogativa que a Administração Pública possui para investigar e punir:

 -  Agentes públicos (servidores) que praticarem infrações funcionais (estatutários e celetistas);

 - Administrados que possuam um vínculo direto com a administração (exemplo: quem tem um contrato administrativo) e pode ocorrer também com os permissionários e concessionários.

*** Portanto, não se aplica poder disciplinar ao administrado comum que não tenha vinculo com a administração.

 

É o poder de aplicar sanções (penalidades) como advertências, suspensão, demissão e deve ocorrer somente após o regular procedimento administrativo pautado no contraditório e na ampla defesa.

 

Atenção para pegadinha de prova: o Poder disciplinar decorre do hierárquico e com base no poder disciplinar a administração pode aplicar sanções aos seus servidores. Porém a administração não pode aplicar sanções com base no poder hierárquico. Portanto, as sanções aos servidores derivam diretamente do poder disciplinar e indiretamente do hierárquico.

 

E) PODER REGULAMENTAR 

 

É o poder que a Administração Pública possui para editar atos gerais/normativos para regulamentar ou complementar a lei para que ela possa ser fielmente executada, mas ele não pode inovar no ordenamento jurídico.

 

Portanto, ao utilizar-se do poder regulamentar a administração não pode criar, extinguir ou alterar uma lei e desta forma, os atos normativos possuem natureza derivada/secundária.

 

É a lei que cria a situação nova. O ato normativo expedido com base no poder regulamentar ele vai somente complementar/regular a lei.

 

Os atos normativos estão previstos no art. 84, IV da CF e são de competência do Presidente da República e estendidos por simetria a todos os Chefes do Poder Executivo (Governadores e Prefeitos) e ocorre quando expedem os decretos.

 

ATENÇÃO: Parte da doutrina entende que quando uma autoridade administrativa edita portarias e resoluções também estará exercendo o poder regulamentar e, portanto esse poder não é exercido somente pelo Chefe do Executivo.

 

DECRETO AUTÔNOMO - Previsto no artigo 84,VI  da CF - ele é de competência do Presidente da República que pode delegar para o Ministro do Estado, Procurador Geral da República (PGR) e Advogado Geral da União (AGU).

 

 O decreto autônomo dispõe sobre a organização e funcionamento da Administração Pública Federal, mas não pode criar novos gastos e nem criar/extinguir órgãos públicos. Poderá, no entanto extinguir cargos e funções quando estiverem vagos.

 

Esse decreto autônomo tem natureza originária e, portanto pode inovar no ordenamento jurídico.

 

Cuidado com a pegadinha:  o Poder regulamentar não pode inovar no ordenamento jurídico, pois ele tem natureza secundária/ derivada a não ser que ele seja exercido como decreto autônomo, pois neste caso é considerado como de natureza originária.

 

F) PODER DE POLÍCIA 

 

Tem como objetivo a restrição/limitação dos direitos individuais para garantir o interesse coletivo. Com esse poder a administração restringe propriedade, liberdade e atividades.

 

O poder de polícia se baseia numa relação de supremacia geral da Administração sobre os administrados  e permite que a Administração Pública condicione ou restrinja o exercício de atividades, o uso e gozo de bens e direitos pelos particulares, em nome do interesse público.

 

Poder de polícia: sentido amplo e sentido estrito

 

Segundo Alexandre Mazza:

 a) poder de polícia em sentido amplo: inclui qualquer limitação estatal à liberdade e propriedade privadas, englobando restrições legislativas e limitações administrativas.

 b) poder de polícia em sentido estrito: mais usado pela doutrina, o conceito de poder de polícia em sentido estrito inclui somente as limitações administrativas à liberdade e propriedade privadas, deixando de fora as restrições impostas por dispositivos legais. (Mazza, Alexandre - Manual de direito administrativo – 9. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019.Pg. 432)

  

Exemplos do poder de polícia:

 

- Interdição de estabelecimento comercial quando a vigilância sanitária faz inspeção e verifica que algo põe em risco a coletividade. 

 

- No período da pandemia do covid também ocorreu restrição a certas atividades, a coletividade era obrigada a usar máscaras,... 

 

- Quando o cidadão quer construir em seu terreno precisa de licença  da prefeitura e, portanto o seu direito de construção fica condicionado a determinadas normas para obter a licença. 

 

- As regras de trânsito são outro exemplo que impõe restrições como não exceder a velocidade em certos locais..locais proibidos para estacionar,...

  

O poder de polícia tem que ser exercido com base em lei prevendo condicionamento/ restrição/ limitação e por meio dos atos administrativos a administração fiscaliza a aplicação da lei e a isso se da o nome de polícia administrativa.

 

A polícia administrativa é diferente da polícia Judiciária, pois esta última trata de ações penais (investigar crimes), enquanto que a polícia administrativa fiscaliza o descumprimento de normas administrativas e também pode atuar de forma repressiva mediante o perigo a coletividade a fim de restabelecer a ordem social, como por exemplo: quando um carro está estacionado em local proibido pode removê-lo, quando um restaurante oferece perigo a saúde pode interditar o local.

 

 Alexandre Mazza analisa a diferença entre polícia administrativa e Judiciária:

 

"a) polícia administrativa: tem caráter predominantemente preventivo, atuando antes de o crime ocorrer, para evitá-lo, submetendo-se essencialmente às regras do Direito Administrativo. No Brasil, a polícia administrativa é associada ao chamado policiamento ostensivo, sendo realizada pela Polícia Militar;

 

b) polícia judiciária: sua atuação preponderante tem natureza repressiva, agindo após a ocorrência do crime para apuração da autoria e materialidade. Sujeita-se basicamente aos princípios e normas do Direito Processual Penal. No sistema atual, a polícia judiciária é exercida pela Polícia Civil e pela Polícia Federal." (Mazza, Alexandre - Manual de direito administrativo – 9. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019.Pg. 439)

 

 A polícia administrativa tem caráter predominantemente preventivo, enquanto a polícia judiciária tem caráter predominantemente repressivo.

 

O conceito do poder de polícia administrativo está previsto no artigo 78 do Código Tributário Nacional:

 

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

 

Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.

 

 CICLO DA POLÍCIA E DELEGAÇÃO DE COMPETÊNCIA 

 

a) Ordem (legislação)- é o ciclo ou fase que envolve a edição de uma norma de polícia. Por exemplo, a norma que dispõe que os carros devem parar quando o sinal está vermelho.

 

b) Consentimento- é o ciclo ou fase que envolve a concordância da administração pública com o exercício de um direito ou atividade por um particular. Por exemplo, quando a administração pública concede a um cidadão que preencheu todos os requisitos legais licença para construir.

 

c) Fiscalização- é o ciclo ou fase que envolve a fiscalização pela administração pública do cumprimento das ordens de polícia, por exemplo, a inspeção da vigilância sanitária em um restaurante.

 

d) Sanção-  é a fase ou ciclo que envolve a aplicação de sanções caso sejam constatadas violações às ordens de polícia. Por exemplo, a interdição ou a aplicação de multa a um estabelecimento pelo descumprimento de normas sanitárias.

 

Sobre a delegação de competência do ciclo da polícia restou sedimentado pelo STF em repercussão geral o tema 532:

 

Tema 532 STF: “É constitucional a delegação do poder de polícia, por meio de lei, a pessoas jurídicas de direito privado integrantes da Administração Pública indireta de capital social majoritariamente público que prestem exclusivamente serviço público de atuação própria do Estado e em regime não concorrencial."

(RE 633782, Relator: LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 26-10-2020, REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO - DJE- 25-11-2020).

 

No tema 532 também ficou determinado que o poder de polícia é essencialmente indelegável a particulares, mas pode ser exercido por entes da administração indireta, desde que estes tenham capital social majoritariamente público e atuem em regime não concorrencial. Isso ocorre porque tais entidades, ao serem controladas pelo poder público, mantêm o compromisso com o interesse público.

 

Portanto, o Supremo reconheceu a possibilidade de delegação dos atos de: consentimento, fiscalização e sanção de polícia, Quanto ao ato ordem de polícia foi reconhecido como absolutamente indelegável.

 

 PRESCRIÇÃO 

 

 Lei 9.873/1999 determina em seu artigo primeiro que: 

 

Art. 1.º Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.

 

 ATRIBUTOS DO PODER DE POLÍCIA:

 

DISCRICIONARIEDADE- como regra o poder de polícia é discricionário, ou seja, quando uma lei é produzida, existirá discricionariedade para que o Estado possa analisar quais limitações são mais convenientes e oportunas. 

 

Entretanto em alguns casos o poder de polícia é vinculado, pois a lei não dá margens para escolhas como é o caso, por exemplo, de licenças – nesse caso, se o cidadão cumpriu com todos os requisitos para construir em seu imóvel (apresentou os projetos...) a administração não pode se negar a liberar a licença para a construção e nesse caso o ato é vinculado. Pelo poder de polícia a administração fiscaliza, mas cumprindo os requisitos deve conceder a licença.

 

COERCIBILIDADE: o poder de polícia se impõe ao particular independente da vontade deste. Como exemplo cita-se o fiscal de vigilância sanitária que ao chegar em um determinado estabelecimento e verificar que o mesmo está em condições perigosas a saúde da sociedade poderá interditar o local mesmo que o dono do estabelecimento não concorde com essa interdição.

 

AUTOEXECUTORIEDADE: independentemente de prévia autorização judicial, a administração pode promover a execução de seus atos. Exemplo: quando o agente de trânsito remove um veículo estacionado em local proibido ele não precisa de autorização judicial para realizar o ato.

 

ATENÇÃO: os atos autoexecutáveis devem estar previstos na lei. Portanto não é qualquer ato que a Administração pode executar sem autorização judicial.

 

Ainda, os atos autoexecutáveis darão ao cidadão a garantia do contraditório e ampla defesa perante a Administração e inclusive perante o Judiciário. 

 

  

QUESTÕES DA BANCA CESPE

 

 CESPE / CEBRASPE - 2025 - FUB - Administrador

 

 Há abuso de poder quando o agente ultrapassa os limites de suas atribuições, mas não se verifica tal vício quando o agente busca alcançar objetivos diversos daqueles previstos em lei, desde que albergados pelo interesse público.

 

Gabarito: errado

 

Segundo Rafael Carvalho Rezende Oliveira, "O exercício abusivo dos poderes administrativos deve ser evitado e reprimido, pois revela conduta ilegal. O abuso do poder pode ocorrer em duas hipóteses:

 

a) excesso de poder: a atuação do agente público extrapola a competência delimitada na lei (ex.: policial que utiliza da força desproporcional para impedir manifestação pública) e

 

b) desvio de poder (ou de finalidade): quando a atuação do agente pretende alcançar finalidade diversa do interesse público (ex.: edição de ato administrativo

para beneficiar parentes)" - (Oliveira, Rafael Carvalho RezendeCurso de direito administrativo – 8. ed. – Rio de Janeiro: Método, 2020. Pg 432).

 

Portanto tendo o agente tentado alcançar objetivos diversos da lei ocorre abuso de poder, pois a finalidade do interesse público está prevista na lei não podendo o agente agir de forma diversa do que está na lei.

 

 

CESPE / CEBRASPE - 2025 - STM - Técnico Judiciário - Área: Administrativa

 

A invalidação da conduta administrativa que incorre em excesso de poder deve ocorrer, necessariamente, em âmbito judicial.

 

Gabarito: errado

 

Pelo princípio da autotutela e pela Súmula 473 do STF"A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial."

 

PORTANTO, quando a questão fala que deve ocorrer necessariamente em âmbito judicial está errada.

 

Ainda, o excesso de poder ocorre por desvio de competência e neste caso a administração pública pode convalidar atos que ocorreram por desvio de competência o que reforça o fato de que não é obrigatória a participação do judiciário.

 

 

CESPE - 2015 - MPOG - Técnico de Nível Superior - Cargo 22

 

A hierarquia existe tanto no âmbito do Poder Executivo quanto no dos Poderes Legislativo e Judiciário com relação às suas funções de natureza administrativa.

 

Gabarito: Certo.

 

Os poderes administrativos são aplicados quando o administrador está exercendo a função administrativa. Desta forma os poderes administrativos são exercidos tanto pelo executivo quando exerce a função típica de administrar, quanto pelo Legislativo e Judiciário quando estão exercendo sua função atípica de administrar.

 

 

CESPE - 2017 - SEDF - Conhecimentos Básicos

 

A avocação se verifica quando o superior chama para si a competência de um órgão ou agente público que lhe seja subordinado. Esse movimento, que é excepcional e temporário, decorre do poder administrativo hierárquico.

 

Gabarito: Certo.

 

O conceito de avocação está no artigo 15 da lei 9784/99: “Será permitida, em caráter excepcional e por motivos relevantes devidamente justificados, a avocação temporária de competência atribuída a órgão hierarquicamente inferior.”

 

CESPE / CEBRASPE - 2016 - TCE-PA - Conhecimentos Básicos

 

A prerrogativa da administração de impor sanções a seus servidores, independentemente de decisão judicial, decorre imediatamente do poder disciplinar e mediatamente do poder hierárquico.

 

Gabarito: Certo.

 

O Poder disciplinar decorre do hierárquico e com base no poder disciplinar a administração pode aplicar sanções aos seus servidores. Porém a administração não pode aplicar sanções com base no poder hierárquico. Portanto, as sanções aos servidores derivam diretamente do poder disciplinar e indiretamente do hierárquico.

 

 

CESPE / CEBRASPE - 2025 - Polícia Federal - Administrador 

 

A atividade do Estado que limita o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público é considerado poder de polícia. 

 

Gabarito: Certo

 

Para Alexandre Mazza: “O poder de polícia, representa uma atividade estatal restritiva dos interesses privados, limitando a liberdade e a propriedade individual em favor do interesse público.” (Mazza, Alexandre - Manual de direito administrativo – 9. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019.Pg 431)

 

 

CESPE / CEBRASPE - 2025 - ANM - Especialista em Recursos Minerais.

 

Denomina-se poder de polícia o poder da administração pública de apurar infrações e aplicar sanções a seus agentes bem como a seus contratados. 

 

Gabarito: errado

 

O poder de apurar e aplicar sanções a seus subordinados e contratados é a definição de poder disciplinar e não de polícia.

 

O poder disciplinar consiste na prerrogativa que a Administração Pública possui para investigar e punir:

 

- agentes públicos (servidores) que praticarem infrações funcionais (estatutários e celetistas);

 

- administrados que possuam um vínculo direto com a administração (exemplo: quem tem um contrato administrativo) e pode ocorrer também com os permissionários e concessionários.

 

CESPE / CEBRASPE - 2024 - TSE - Analista Judiciário - Área: Administrativa - Especialidade: Contabilidade

 

No exercício do poder regulamentar, pode o chefe do Poder Executivo tanto baixar um decreto para fiel execução da lei, quanto dispor, também por meio de decreto, sobre organização e funcionamento da administração federal, mesmo que isso implique aumento de despesa, criação ou extinção de órgãos públicos.

 

Gabarito: errado

 

O poder regulamentar está previsto no artigo 84, inciso IV, da Constituição Federal, que autoriza o Presidente da República e por simetria os demais Chefes do Executivo a:

 

IV- sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução.

 

E no inciso VI fala sobre o decreto autônomo:

 

VI - dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos.

 

Portanto o erro da questão ocorre quando diz: mesmo que isso implique aumento de despesa, criação ou extinção de órgãos públicos, pois como vimos existe vedação no artigo 84, VI letra a.

 

 

CESPE / CEBRASPE - 2024 - MPO - Conhecimentos gerais para todas as especialidades

 

 

O abuso de poder pode ser caracterizado pelo excesso de poder, situação em que o agente público atua fora dos limites de sua competência. 

 

Gabarito: certo

 

Para Hely Lopes Meirelles: "O excesso de poder ocorre quando a autoridade, embora competente para praticar o ato, vai além do permitido e exorbita no uso de suas faculdades administrativas. Excede, portanto, sua competência legal e, com isso, invalida o ato, porque ninguém pode agir em nome da Administração fora do que a lei lhe permite." (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 106-108).


 


Outra questão semelhante sobre excesso de poder:

 

CESPE / CEBRASPE - 2023 - TC-DF - Analista Administrativo de Controle Externo

 

Excesso de poder é uma das formas de abuso de poder e ocorre quando a administração pública persegue uma finalidade legal, mas vai além do necessário para atingi-la.

 

Gabarito: Certo

 

Como vimos na questão anterior, o excesso de poder ocorre quando a autoridade, embora competente para praticar o ato, vai além do permitido e exorbita no uso de suas faculdades administrativas.

 

 

CESPE / CEBRASPE - 2023 - MPE-RO - Analista em Auditoria

 

 

Assinale a opção em que é corretamente indicada a prerrogativa da administração pública caracterizada predominantemente por atos normativos ou concretos da administração, com fulcro na supremacia geral do interesse público, a fim de condicionar a liberdade e a propriedade individual por meio de ações fiscalizadoras, preventivas e repressivas, na forma da lei. 

 

a- poder hierárquico 

b- poder normativo 

c- poder disciplinar 

d-poder regulamentar 

e- poder de polícia

 

Gabarito letra e.

 

O conceito do poder de polícia está previsto no artigo 78 do CTN. Quando a questão fala sobre atos normativos e concretos está se referindo ciclo da polícia: normativos - ordens de polícia e concretos - fiscalização, consentimento e sanções.

 

 

CESPE / CEBRASPE - 2023 - CNMP - Analista do CNMP – Àrea: Apoio Jurídico – Especialidade: Direito

 

 

A administração tem como prerrogativa praticar os atos de polícia e colocá-los em imediata execução ante a coercibilidade de que eles se revestem.

 

 

Gabarito: errado 

 

O atributo que permite à administração a prerrogativa de colocar os atos de polícia em imediata execução é o atributo da autoexecutoriedade e não o da coercibilidade.

 

O atributo da coercibilidade prevê que a Administração pode impor o ato de polícia sem o consentimento do administrado.

 

 

CESPE / CEBRASPE - 2023 - TJ-ES - Analista Judiciário - Especialidade: Comissário de Justiça da Infância e Juventude

 

Conforme a doutrina e a jurisprudência dominantes, o ato do poder de polícia pode ser dividido nas seguintes quatro fases ou ciclos: ordem de polícia, consentimento de polícia, fiscalização de polícia e sanção de polícia.

 

Gabarito: certo

 

A questão fala do ciclo da polícia: Ordem (legislação), consentimento, fiscalização e sanção.

 

CESPE / CEBRASPE - 2024 - Câmara de Maceió - AL - Apoio Administrativo

 

Maria requereu a expedição de certidão em determinada autarquia federal, para defesa de direito de interesse pessoal. Passados mais de 15 dias da solicitação, Caio, servidor comissionado da referida autarquia e responsável pela emissão do citado documento, deixou de fazê-lo, o que gerou dano a Maria. Indignada, ela apresentou recurso ao chefe de Caio, formulou denúncia à corregedoria da autarquia e ajuizou ação pleiteando indenização, tendo demonstrado o prejuízo sofrido.

Considerando essa situação hipotética, julgue o item a seguir.

A apreciação do recurso pelo chefe de Caio representa controle da administração pública mediante exercício do poder hierárquico.

 

Gabarito: certo

 

Di Pietro informa que também decorre do poder hierárquico: " O de controlar a atividade dos órgãos inferiores, para verificar a legalidade de seus atos e o cumprimento de suas obrigações, podendo anular os atos ilegais ou revogar os inconvenientes ou inoportunos, seja ex oficio, seja mediante provocação dos interessados, por meio de recursos hierárquicos;" (Di Pietro, Maria Sylvia Zanella Di Pietro – Direito Administrativo- 32. Ed.- RJ: Forense- 2019- Pg. 265).

 

BONS ESTUDOS!!


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